O Brasil ainda é um país que vive a sombra do racismo. Digo isso primeiramente porque o nosso país foi um dos últimos a abolir a escravidão e, mesmo assim, só aboliu por pressão internacional e interna. Quando aboliu, deixou aqueles que foram retirados de suas terras e tiveram seus direitos anulados por tantos anos, jogados nas ruas, marginalizados e sem ter para onde ir.
Muitos foram para lugares abandonados e morros. Assim, iniciou-se a formação das favelas. Além disso, todos os dias vemos casos de violência racial explodir, mesmo com toda informação à disposição.
Quando falamos sobre racismo, somos taxados como chatos, neuróticos, que estamos procurando coisas onde não há, mas quem vive na pele sabe bem do que estou falando.
Resolvi escrever este artigo porque cansei de ver a pauta racial ser tomada por empresas e pessoas que não têm compromisso com a luta antirracista, que se utilizam do movimento para ficar bem na foto e para encher seus cofres de dinheiro, já que o movimento negro, e uma parte significativa da sociedade, não tolera mais o crime de racismo, que até outro dia não dava em nada.
Caso Carrefour
O primeiro grupo é o do Carrefour, que desde 2009 pratica diversos e graves crimes de racismo, inclusive com morte no ano de 2009. Vale lembrar alguns casos, dentre eles, destaco o do Januário que foi espancado por funcionários do Carrefour. Segundo o grupo, ele estava tentando roubar um carro, mas o detalhe que chama atenção é que o carro era do próprio Januário.
Em 2018, no Carrefour de São Bernardo, João Carlos, deficiente, também foi espancado, só que dentro do banheiro por abrir uma cerveja. Entre os anos de 2017 e 2018, uma mulher dependente química foi espancada e estuprada por furtar alimentos no Carrefour Rio de Janeiro. Um caso resultante de morte foi o espancamento até a morte de João Alberto Silva Freitas por dois seguranças no Carrefour de Porto Alegre.
Entre os casos mais recentes, temos o caso da professora Isabel, que ocorreu neste ano de 2023. Ela afirma ter sido perseguida por um segurança durante todo o tempo em que ficou dentro do Atacadão pertencente ao grupo Carrefour. Revoltada, ela ficou apenas de lingerie para provar que não estava roubando nada.
Do ano de 2009 até agora, são 14 anos de casos e mais casos de crimes com recortes raciais, envolvendo o mesmo grupo e suas ações têm sido aquém do que precisa ser tomado. Só passaram a se movimentar graças a pressão dos movimentos contra o racismo da sociedade, porém sua estratégia foi investir pesado em marketing para dizer que são contra o racismo. Isso tem um único objetivo que é ficar bem e seguir lucrando muito. Na prática não mudou muita coisa, além do grupo há diversas outras empresas que devemos ficar de olho e cobrar.
Artistas e famosos
No grupo de pessoas, temos a cantora Luíza Sonza que, em 2018, foi acusada de racismo por Isabel Macedo, uma advogada que passava férias e estava hospedada no mesmo local que a cantora fez um show. Após o caso vir à tona, logo de cara a cantora tentou descredibilizar a vítima, chamando-a de mentirosa e dizendo que queria apenas ganhar notoriedade e pegar carona em sua fama.
Isso pegou mal, pois os movimentos antirracistas não aceitaram e passaram a cobrar dela, que, com seu privilégio de cantora POP branca ia dividir o palco com um cantor no festival de REP com “E”. Após as cobranças e repercussões negativas, teve seu nome retirado e precisou cancelar sua turnê para se defender e ficar bem na foto.
Com isso, a cantora fez um acordo com a vítima e na sequência redigiu uma publicação dizendo que não estava bem e que reconhecia seu erro. Também disse que não contestaria o valor da indenização, culpou o racismo estrutural por sua atitude e nesta semana abriu um restaurante com dona Carmem Virginia, uma renomada chefe de cozinha negra e pernambucana. Acredite quem quiser, porém eu não acredito em coincidências.
Fábio Porchat e Léo Lins
Há também um humorista, Fábio Porchat, que há tempos atrás fez um post bonitinho dizendo ser um racista em desconstrução, mas quando a justiça remove conteúdo de um colega seu por ser racista e ofender as minorias, a primeira coisa que o tal racista em desconstrução faz é defender seu colega humorista racista, ao invés de criticar o ato. Logo mais, veremos um pedido de retratação elaborado pelas relações públicas na tentativa de limpar a imagem do cidadão que infelizmente seguirá lucrando em cima de um movimento tão sério.
A luta contra o racismo é tão antiga e injusta, que ainda vivemos num mundo desigual e que quando envolve cor e raça, a desigualdade é maior ainda. Se for mulher preta, nem se fala.
É revoltante ver marcas que não se importam com a causa, que apenas se importam em ter lucros, ficarem bem na foto como uma empresa não racista. Isso é lamentável. Por outro lado, tenho visto movimentos bastante significativos na sociedade, como o boicote a marcas racistas e preconceituosas, que cometem o crime de trabalho escravo.
Devemos tentar não cair nas armadilhas dessas organizações, que fingem se preocupar com o racismo. Continuar lutando para reforçar a presença da negritude em espaços de poder e de decisão é de suma importância, já que somos grande parte da sociedade.
No entanto, quando se chega nas melhores posições, quase não existimos. Desse modo, é importante que o racismo fique apenas nos livros para que a sociedade não se esqueça e não volte a repeti-lo. Até lá, estaremos na luta contra este crime e contra os racistas.
Texto escrito por Ivo Mendes
É ativista e militante há mais de 12 anos em pautas antirracistas e no combate às desigualdades sociais no Brasil. Retirou o medo do seu vocabulário, por isso é um sonhador por essência e entusiasta por sobrevivência. Formado em Gestão da Tecnologia da Informação, passou pela vida política da Baixada Santista e atualmente trabalha na área administrativa e integra a equipe de colunistas do Zero Águia.
Revisão por: Mateus Santana
Edição por: Eliézer Fernandes
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