Quem (ainda) ocupa os espaços de poder?
- Ivo Mendes
- 14 de jun.
- 3 min de leitura
Atualizado: 10 de jul.
A ascensão da população negra brasileira pareceu, durante muitas décadas, um sonho utópico. A chamada abolição da escravidão no Brasil foi mais uma lei “para inglês ver” do que um verdadeiro ato reparatório. Naquela época, já não era possível conter as rebeliões dos movimentos pró-abolição, além da crescente pressão internacional pelo fim da escravidão.

— Reprodução
Diferente do que se esperaria de um país cuja economia foi construída sobre a escravidão, a dor, o sofrimento e a morte de pessoas escravizadas, o processo de libertação não veio acompanhado de reparação, justiça, divisão de terras ou garantia de direitos. Em vez disso, gerou desigualdade e miséria. Sem ter para onde ir e sem políticas reparatórias, os ex-escravizados ocuparam morros e periferias, perpetuando desigualdades que persistem até os dias atuais.
Como herança da pós-abolição, o Brasil se tornou um dos países mais desiguais do mundo, especialmente no que diz respeito à desigualdade racial e social.
Políticas de reparação
Ao longo dos anos, o povo negro lutou e continua lutando por políticas públicas de reparação, buscando reduzir as desigualdades raciais e promover uma disputa mais equitativa. Infelizmente, na corrida da vida, a população negra parte em desvantagem, enfrentando barreiras como o racismo estrutural, a ausência de políticas públicas eficazes, a desestruturação familiar e a violência.
O movimento negro travou batalhas significativas para que o Estado brasileiro criasse políticas públicas voltadas à equidade racial. Felizmente, houve avanços: políticas afirmativas começaram a ser implementadas, como as cotas raciais para o ingresso no ensino superior - uma forma de reequilibrar oportunidades - e as cotas em concursos públicos. Além disso, a criação de ministérios e órgãos dedicados à formulação de políticas para a população negra representou um passo importante.

No entanto, é fundamental destacar que essas iniciativas ainda não são suficientes para eliminar as desigualdades raciais. Apesar disso, elas têm desempenhado um papel significativo na redução dessas disparidades, contribuindo para mudanças estruturais e promovendo um cenário mais justo para as próximas gerações.
Negras e negros em espaços de poder
Essa é a parte em que eu gostaria de escrever sobre uma ascensão massiva da população negra, mas, infelizmente, as desigualdades ainda são extremamente acentuadas, fruto de uma sociedade profundamente racista e discriminatória. É inaceitável que a população negra, que representa 56,1% da população brasileira ( segundo dados do IBGE), ocupe apenas 24% das 513 cadeiras no Congresso Nacional e que menos de 3% dos homens e mulheres negras alcancem cargos de gerência e diretoria no mundo corporativo. Essa discrepância evidencia uma desigualdade estrutural que precisa ser enfrentada.
Como homem negro, faço questão de ressaltar que ainda há um longo caminho a percorrer para alcançar a justiça racial. Para mim, isso significa ver 56,1% de pessoas negras em cargos de liderança, nos serviços públicos e no legislativo. Olhando para trás, reconheço os avanços que conquistamos: em diversas áreas, há pessoas negras como referência - seja nas artes, na educação, na literatura, na ciência, na medicina, no direito ou no mundo corporativo. Houve um tempo em que ver negros nessas posições era algo imaginável apenas para nós, e felizmente, por meio de politicas reparadoras, ações afirmativas e muita luta, conseguimos imprimir mudanças significativas.
Hoje, negros na classe média e nas classes mais altas já são uma realidade, mas ainda vivemos em um mundo onde desigualdades persistem. O ideal seria que essas disparidades não existissem, mas, como elas continuam a marcar nossa sociedade, cabe a nós lutarmos para reduzi-las, garantindo que mais pessoas negras ocupem espaços de poder e tomada de decisão.
Texto escrito por Ivo Mendes
É ativista e militante há mais de 14 anos em pautas antirracistas e no combate às desigualdades sociais no Brasil. Retirou o medo do seu vocabulário, por isso é um sonhador por essência e entusiasta por sobrevivência. Formado em Gestão da Tecnologia da Informação, passou pela vida política da Baixada Santista e integra a equipe de colunistas do Portal Águia.
Revisão por: Eliane Gomes
Edição por: João Guilherme Veiga Grecco
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