“Peça de teatro cujo assunto é geralmente tirado de factos ridículos e jocosos da vida social, com personagens e situações que são tratadas de forma a provocar riso ou divertimento”.
A origem
De origem Grega, o gênero de comédia já era algo destinado ao popular, incluindo os marginalizados e mais pobres. Junto à comédia foi criado o gênero chamado tragédia que contava, a partir da dramaturgia, a história de heróis e deuses. Na maioria dos casos, essas peças teatrais eram destinadas aos nobres. Já a comédia contava a história de homens comuns e era destinada ao povo.
Mesmo marginalizada, a comédia tinha um papel político muito importante, pois conversava com a população mais simples. A partir de um ato que era chamado de “agón”, alguns problemas eram apresentados em forma de sátiras e deboche entre os protagonistas que logo após conversavam com a plateia, tentando esclarecer e também tomar rumos novos ao que foi apresentado no primeiro ato.
Essa pratica é realizada até hoje em espetáculos de standup comedy e ainda leva o mesmo sentimento ao espectador que se sente parte da história e com uma ilusão de participação, embora no final a decisão do rumo dessa história não seja a dele.
Muitas peças zombavam e satirizavam a derrota de inimigos em guerras, em que eram explorados estereótipos ligados aos líderes inimigos e os aumentavam até o ponto de se tornarem engraçados.
A comédia sofre sua primeira poda após a rendição de Atenas na Guerra do Peloponeso. Com a chegada da democracia, a comédia passou a não satirizar e zombar de forma agressiva os temas políticos e as histórias de personalidades não eram mais abordadas, uma vez que foram reduzidas apenas as emoções e relações humanas, que agora eram abordadas com uma linguagem mais respeitosa.
Comédia e suas ramificações
Passando por muitas mudanças desde sua criação, a comédia se ramificou e passou a ter diversos gêneros ou formas de ser apresentada. Por meio disso, começou a gerar controvérsias sociais quando certos gêneros não eram agradáveis a determinado público, porém, para outros, ela seria o limite da comédia ou do humor. Com isso, pode-se explorar problemas apresentados em diversos gêneros da comédia:
Pastelão ou Slapstick é o famoso gênero de torta na cara apresentados em Três Patetas ou mesmo de forma circense e trata-se de textos e histórias absurdas com desfechos cômicos que consistem na sua maior parte em violência física.
Muitos problematizam esse gênero como forma de incentivo à violência física em situações de mal entendido ou mesmo agressão verbal. Nesse sentido, é possível perceber em várias obras do gênero que uma parte sempre se zanga após um acidente ou zombaria vinda da outra parte, de modo que o ápice comido é justamente a agressão. Outro ponto é a falta de empatia, pois muitas vezes esse ápice também vem a partir de um acidente sofrido por uma das partes na qual a segunda zomba do fato ocorrido.
A comédia de bordões tem um trunfo diferente das demais, pois ela não surpreende. As situações são apresentadas e há frases de efeito já conhecidas e proferidas ao final do ato pelos personagens.
Exemplos claros dessa comédia são apresentados em novelas e séries como em Chaves, que mesmo sendo repetitivo e previsível continua sendo cômico para parte do público. O problema apontado, neste gênero, é justamente sua maior característica: a previsibilidade, que muitos zombam e descreditam com o argumento de que sem o fator surpresa é impossível ver graça em obras do gênero.
O gênero que arremete a nova comédia grega é a comédia romântica explora os sentimentos com fatos cotidianos de um par romântico de forma cômica e sempre finalizada com um final feliz.
Nesse caso, a maioria das críticas a esse gênero são sobre estereótipos e o clichê de um final feliz que nem sempre na vida real é possível, causando uma falsa ilusão de um mundo perfeito e feliz em quem o consome.
Um exemplo claro do próximo gênero é o gigante Porta dos Fundos que através de sketches se utiliza do gênero de sátira, em quase sua totalidade, e trata de forma cômica temas sérios de uma sociedade, tais como preconceito, economia, política e outros.
Sendo um gênero muito plural não há muita problematização, porém em alguns casos esse gênero esconde um viés que busca manipular o público e construir ideias que podem estar relacionadas a marcas, política, gênero e diversos outros componentes que compõem a sociedade.
No cotidiano, as pessoas passam por diversas situações diariamente e a comédia também explora isso a partir do gênero denominado observação, cujo autor baseia-se em situações cotidianas para montar o seu texto.
A prática consiste em dar teor de humor a essas situações e na maioria das vezes exagerar ou aumentar o ocorrido para revelar um lado cômico em coisas do cotidiano. Nesse gênero, as críticas também são relacionadas ao fortalecimento de estereótipos referentes à raça, regionalidade e gênero. Muitas vezes há uma generalização sobre as atitudes e costumes de determinados grupos.
Constrangimento é uma palavra que quando citada dificilmente se pensa em algo engraçado, porém é utilizada por muitos artistas da comédia. Utilizando alguns artifícios que causam aflição ao público, esse gênero se encontra em ascensão e a cada dia se torna mais popular.
Nesse caso, as críticas ficam por conta da degradação do artista que se propõe a praticar essa vertente cômica, que na maioria das vezes se coloca em situações totalmente vexatórias e em algumas outras utiliza de ofensas para atingir o ápice cômico. Muitos acham extremamente desagradáveis e sem graça e outros extremamente engraçados, ou seja, há um “8 ou 80”, neste caso.
Pensar em uma coisa que não faz sentido algum também pode render muitas risadas. Esse é o artificio do nonsense com premissas totalmente absurdas que fogem da realidade e desfechos que vão para uma direção oposta da sua premissa.
Esse gênero não se prende a nenhuma regra ou lógica.
Portanto, esse é mais um caso de amor ou ódio ao público que não consome o gênero e baseia-se suas críticas no ponto principal, em que há falta de sentido no enredo que, para eles, apenas gera confusão de ideias.
Por fim, existe o humor ácido que talvez seja o mais controverso de todos. A ideia aqui é achar graça em situações totalmente extremas como acidentes, morte, doença, discriminação, abusos, entre outros temas sensíveis à sociedade.
Os artistas que praticam esse tipo de humor alegam que o objetivo é o alivio cômico nessa situação, ou seja, rir de uma situação ruim para torná-la melhor e que de forma alguma expressam suas opiniões pessoais ou tentam ofender alguém utilizando a piada. Nesse caso, são óbvias as críticas realizadas ao gênero que trata de assuntos e acontecimentos sensíveis à maioria da sociedade comicamente sem nenhuma exceção. Os críticos citam até que a prática influencia e estimula a violência e o preconceito de forma ampla e aberta.
Provavelmente, não foi abordado todos os tipos de humor acima, porém, como visto, é possível independente do gênero realizar crítica aos mesmos. Como qualquer outro assunto ou tipo de arte, sempre haverá discordância devido aos diferentes ambientes de criação de um indivíduo na sociedade.
É entendido que tudo muda e, claro que junto com as mudanças, assuntos e conteúdos não cabem mais ser abordados de certas formas, mas caso o objetivo seja apenas problematizar algo, é possível fazer, conforme visto acima.
O limite do humor
Muito se discute onde é o limite do humor, até que ponto os artistas podem ir, quais assuntos podem ser abordados e de que forma esses temas devem ser tratados. Em muitos casos, a linha entre uma piada e uma ofensa é muito tênue e partindo do princípio que o humor consiste em extrair a graça de acontecimentos, seja ele qual for, pode gerar riso em algumas pessoas, porém ofender outras.
Há algumas teorias de onde seria esse limite: muitos dizem que esse limite é o ambiente, ou seja, há piadas adequadas para o ambiente e o público presente nele tem a ciência do teor do conteúdo que o artista em questão oferece.
Alguns julgam que esse limite se encontra na ofensa e que mesmo que alguns riam da piada, caso ela ofenda uma pessoa ou determinado grupo social, não deve ser apresentada como forma de arte. Por último, o limite do riso, utilizando o argumento de que o determinante para diferenciar a piada de uma ofensa, é a risada. Muitos julgam que o limite seria esse. Enquanto houver riso, independente do tema abordado e do gênero humorístico utilizado, essa piada pode ser feita.
O humor e a Política
Conforme apresentado, desde sua origem a política interfere diretamente na comédia. Em alguns países como os EUA, a influência é mínima, apenas afetando as pautas e assuntos que vão ser tratados pelo humorista. Já em outros países, a política tenta ainda interferir diretamente regulando os assuntos e até mesmo impedindo espetáculos de serem executados e movendo ações judiciais contra os comediantes.
No Brasil, há relatos de comediantes que foram impedidos de se apresentar e receberam processos movidos por figuras políticas. Recentemente a lei de Crime Racial sofreu uma alteração que impacta diretamente os artistas da comédia e muitos se manifestaram alegando que a mesma impõe uma censura no conteúdo de sua arte.
Abaixo pode-se ler trechos questionados por personalidades e os próprios humoristas:
“§ 2º-A. Se qualquer dos crimes previstos neste artigo for cometido no contexto de atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais destinadas ao público: Pena: reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e proibição de frequência, por 3 (três) anos, a locais destinados a práticas esportivas, artísticas ou culturais destinadas ao público, conforme o caso.”
“Art. 20-A. Os crimes previstos nesta Lei terão as penas aumentadas de 1/3 (um terço) até a metade, quando ocorrerem em contexto ou com intuito de descontração, diversão ou recreação.”
Muitos dos comentários colocam em evidência que o julgamento de um caso como este depende muito da interpretação de quem o julga e a influência do acusador pode afetar drasticamente uma decisão contra o acusado que, no caso de um artista de humor, alega apenas apresentar sua arte, sem expor sua opinião ou incitar qualquer tipo de preconceito ou violência.
Em minha visão, a arte não deve ser limitada, mas sim incentivada. Uma peça de teatro tem que expressar a arte de forma pura e a comédia se encaixa na mesma categoria. Quem deve julgar a qualidade ou não do conteúdo é o público que a consome. Caso isso não ocorra, iremos caminhar para algo muito próximo à censura e até mesmo a extinção de formas de artes, devido à repressão dos artistas.
Texto escrito por Henrique Cunha
Profissional de TI, formado em Análise e Desenvolvimento de Dados. É um curioso nato, amante de música, filmes e séries do universo geek. Colunista de variedades do Zero Águia.
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