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Minimalismo: Por que o mundo está ficando menos colorido?

Fachada de prédio gerada por IA. As janelas são quase todas iguais, sem cores fortes. A parede é cinza.
O minimalismo influencia até mesmo a padronização arquitetônica / Imagem gerada por IA

Já ouviu falar daquela brincadeira antiga do fusca azul? Era um jogo bem simples, geralmente praticado em viagens ou passeios, cujo objetivo  era observar o tráfego e ser o primeiro a identificar o icônico carro, gritando “fusca azul” antes dos outros. Quem o avistava primeiro ganhava o direito de dar um leve soco no braço dos demais participantes, uma brincadeira sem pontuação fixa, mas que servia como uma forma de passar o tempo.


Hoje em dia, fuscas já não são tão comuns, muito menos carros azuis. A verdade é que, ao longo dos anos, não apenas os veículos perderam suas cores. Tons vibrantes foram desaparecendo das ruas, casas e espaços; estilos de vida foram substituídos por padrões básicos, em busca de uma rotina considerada saudável e perfeita.


Diante dessas mudanças, fica a pergunta: ainda é possível brincar de “fusca azul” em um mundo cada vez mais acinzentado?


Um estilo de vida


O minimalismo ganhou destaque nos últimos anos como um estilo de vida centrado na simplicidade e redução do consumo, uma forma de viver que busca propósito consciente, priorizando o essencial e deixando de lado excessos que não agregam valor ao indivíduo.


Nesse contexto, a proposta surge como uma alternativa para cultivar consciência sobre o que realmente importa, seja nas escolhas de compra, nos relacionamentos ou na organização do tempo.


Entretanto, apesar de seu apelo contrário aos ideais de consumo, o minimalismo na sociedade contemporânea passou a se integrar a uma tendência de valorização individual. Trata-se de um movimento que, muitas vezes, desvia a atenção de questões estruturais, como desigualdade e exploração econômica. À medida que se espalha por outras esferas, sua proposta original começa a ser diluída e apropriada pelo próprio sistema que buscava criticar.


Com isso, a estética minimalista se encaminha para um campo de consumo considerado “limpo”, mas que não é acompanhado por mudanças sistêmicas na industrialização.  Até mesmo a arte perdeu parte de seu valor e significado, tornando-se objeto de reprodução em massa.


O minimalismo nas artes


O minimalismo surgiu nos Estados Unidos, na década de 1960, como  resposta ao expressionismo abstrato que dominava as artes plásticas no pós-guerra, um período marcado por obras carregadas de emoção e subjetividade. em oposição a isso, o movimento buscou eliminar excessos e reduzir as obras a formas simples, cores puras e objetividade, evitando narrativas e simbolismos.


A arte passou, então, a seguir uma linha contínua e padronizada, com foco na ordem e na racionalidade, influenciando aspectos do cotidiano como arquitetura, design e literatura.


O mercado transformou o “menos é mais” em uma estética comercial, convertendo a simplicidade em produto de luxo. Ambientes minimalistas passaram a ser promovidos como sinônimo de sofisticação, enquanto marcas exploram o visual limpo para justificar preços elevados e reforçar distinções sociais.


Assim, o minimalismo corre o risco de se tornar apenas mais uma linguagem do consumo, esvaziada de seu potencial transformador. A arte, que antes buscava romper com o excesso emocional e simbólico, passou a ser usada como ferramenta de marketing, reforçando a lógica da exclusividade e da performance visual. Em vez de provocar reflexão, ela é frequentemente reduzida a um ideal de perfeição estética.


O impacto na sociedade contemporânea


Um dos efeitos observados nos últimos anos com a padronização mercadológica foi a perda das cores. O fusca azul foi apenas o início de um movimento que se espalhou para outros automóveis e influenciou até mesmo a arquitetura contemporânea, que perdeu parte de sua autenticidade ao  tentar se encaixar em padrões globais.


Essa homogeneização estética não se limita à aparência das cidades ou aos objetos que consumimos, ela também molda como nos expressamos e nos relacionamos com o mundo. Ao se inserir em ambientes onde tudo é similar, o indivíduo tende a perder referências diversas, sejam culturais ou identitárias. O que antes era sinônimo de originalidade e pertencimento, hoje é frequentemente substituído por escolhas guiadas por tendências globais e algoritmos de consumo.


O resultado é uma sociedade cada vez mais desconectada e alheia, onde a diversidade visual, arquitetônica e comportamental se encaixa em uma paisagem de uniformidade silenciosa. A padronização, disfarçada de modernidade e praticidade, apaga diferenças e torna o cotidiano menos entusiasmante, mais previsível e, talvez, menos humano.


Texto escrito por Alice Trindade

É graduada em Comunicação Social - Jornalismo, gosta de bons livros, cafés da tarde e sempre está em busca de novos hobbies. Atualmente, integra a equipe de colunistas do Portal Águia.



Revisão: Eliane Gomes

Edição: João Guilherme V. G.

Referências




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